ATA DA QÜINQUAGÉSIMA QUINTA SESSÃO SOLENE DA QUINTA SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA NONA LEGISLATURA, EM 10.12.1987.

 


Aos dez dias do mês de dezembro do ano de mil novecentos e oitenta e sete reuniu-se, na Sala de Sessões do Palácio Aloísio Filho, a Câmara Municipal de Porto Alegre, em sua Qüinquagésima Quinta Sessão Solene da Quinta Sessão Legislativa Ordinária da Nona Legislatura, destinada a entrega do Prêmio de Teatro Qorpo Santo ao ator Luíz Carlos Magalhães, concedido através do Projeto de Resolução n° 06/87 (proc. n° 721/87). Às dezessete horas e vinte e cinco minutos, constatada a existência de “quorum”, a Srª. Presidente declarou abertos os trabalhos e convidou os Líderes de Bancada a conduzirem ao Plenário as autoridades e personalidades presentes. Compuseram a MESA: Ver. Brochado da Rocha, Presidente da Câmara Municipal de Porto Alegre; Sr. Luíz Carlos Magalhães, Homenageado; Srª. Carmem Silvia Fonseca, irmã do Homenageado; Arq. Paulo Pereira e Silva, representando o Prefeito em Exercício Sr. Glênio Peres; Sr.Arines Ibias, Presidente do Sindicato dos Artistas e Técnicos de Artes Cênicas do Rio Grande do Sul; Sr. Ronald Radde,Presidente da Associação de Produtores de Espetáculos Teatrais do Estado do Rio Grande do Sul; Prof. Joaquim José Felizardo, Diretor do Centro Municipal de Cultura; Prof. Dante de Laytano,Presidente da Academia Sul-rio-grandense de Letras;Profª.Ana Cândida Vilas Boas Gonçalves, 1ª Professora do Homenageado; Verª. Gladis Mantelli, 1ª Secretária da Câmara Municipal de Porto Alegre. A seguir, a Srª. Presidente concedeu a palavra aos Vereadores que falariam em nome da Casa. O Ver.Antonio Hohlfeldt, como proponente da presente Sessão Solene e em nome das Bancadas do PT, PDT, PDS, PSB, PL e PC do B, historiou acerca da vida artística do Homenageado, registrando personagens interpretados S.Sª. e as emoções provocados pelos mesmos, dizendo, ao final, da honra da Casa em homenageá-lo. O Ver. Lauro Hagemann, pela Bancada do PCB, lembrou a convivência profissional com o Homenageado e teceu considerações sobre sua contribuição para o engrandecimento da arte em nosso Estado. O Ver. Raul Casa, em nome da Bancada do PFL, congratulou-se com o Sr. Luíz Carlos Magalhães pela homenagem ora prestada, dizendo que esta Casa resgata uma dívida, pois S. Sª. com seu exemplo e postura é daquelas pessoas que dignifica a comunidade em que vive. A Verª. Gladis Mantelli, que em nome da Bancada do PMDB, discorreu sobre o teatro, analisando suas várias facetas,dizendo que a arte sempre foi uma forma aberta de desafio e rebeldia e o teatro tem assumido, em diferentes períodos de sua trajetória histórica, um papel de agente de contestação e de espelho do cotidiano. Teceu comentários sobre o significado do Prêmio de Teatro Qorpo Santo, salientando ser dever desta Casa ressaltar e valorizar as expressões culturais que venham ao encontro dos objetivos de uma sociedade na constante busca de seu aperfeiçoamento. Em continuidade, o Sr. Presidente convidou os presentes a, de pé, assistirem à entrega, pelo Ver. Antonio Hohlfeldt, do Prêmio de Teatro Qorpo Santo ao Sr. Luíz Carlos Magalhães e concedeu a palavra ao Homenageado que agradeceu o Prêmio recebido. A seguir, o Sr. Presidente fez pronunciamento alusivo à solenidade, convidou as autoridades e personalidades presentes a passarem à Sala da Presidência e, nada mais havendo a tratar, levantou os trabalhos às dezoito horas e vinte e oito minutos, convidando os Senhores Vereadores para a Sessão Solene, às dezenove horas, para entrega do Título Honorífico de Honra ao Mérito Atlético ao tenista gaúcho Thomaz Koch. Os trabalhos foram presididos pelos Vereadores Brochado da Rocha e Gladis Mantelli e secretariados pela Verª. Gladis Mantelli. Do que eu, Gladis Mantelli, 1ª Secretária, determinei fosse lavrada a presente Ata que, após lida e aprovada, será assinada pelo Sr. Presidente e por mim.

 

 


A SRA. PRESIDENTE (Gladis Mantelli): Com a palavra, o Ver. Antonio Hohlfeldt, que falará pelas Bancadas do PT, PDT, PDS, PSB, PL e PC do B.

 

O SR. ANTONIO HOHLFELDT: Senhores Vereadores e demais presentes.

Reunimo-nos hoje aqui, para homenagear Luiz Carlos Magalhães, o ator. Este Magalhães que nos lembra um outro, histórico e arrojado, um Fernão de Magalhães que ousou os mares, dobrou as praias, deu nome a um estreito e hoje é lembrança na memória e na admiração de todos nós.

Magalhães - que lembra maga, magia, mago - em sua tarefa de ator de teatro é exatamente isto: um arrojado que venceu dificuldades, saindo de sua à beira mar cidade natal, Rio Grande, a mais antiga e histórica da província, para enfrentar, não o oceano, mas o desafio histórico de fazer e ser parte do teatro do Rio Grande do Sul.

Meu querido Maga, que tantos vêm hoje a esta Casa homenagear através deste pequeno mas significativo gesto da Câmara Municipal de Porto Alegre: custei a me a decidir se escrevia esta saudação ou simplesmente subia a esta tribuna, que na nossa tarefa ocupamos tantas e tantas vezes por dia, e te dizia do carinho, da admiração, do respeito que te votamos. Decidi-me pelo escrito, porque para um ator como tu, que tantas e tantas vezes subiste a um palco para dizer um texto, fosse a fala de uma personagem, fosse um poema, não seria bom correr o risco da improvisação. E também porque, confesso, queria organizar-me no sentido de recordar algumas imagens que guardo de tuas atuações nos vários espetáculos de que participaste.

Lembro-me de ti, por exemplo, em “Toda a nudez será castigada”, do Nelson Rodrigues, na encenação do então jovem estreante diretor Miguel Grant; e tão diferente, e tão contrário, as tuas atuações nas gozadíssimas comédias de Fernando Worm, “A Pílula” e “O Transplante”, dirigidas por Delmar Mancuso, encenações que tiveram um apoio e uma participação inesquecíveis de um jornalista muito ligado ao teatro mas que cedo nos abandonou, o Marcelo Renato do Jornal do Comércio.

Mas nos meus encontros, Maga, a primeira grande memória é o monólogo que viveste, sob a direção do Vitor Hugo Recondo, “Diário de um Louco”, peça de resistência que só grandes intérpretes podem enfrentar e vencer, passando plenamente ao espectador o grande texto do dramaturgo russo Gogol.

Era nosso pequenino teatro da rua General Vitorino, na Ladeira lembras? Cena gostosa, próxima e intimista, que o Miguel Grant tanto usou que abrigou tantos e tão inesquecíveis espetáculos. A luz, no meio da cena, aumentava tuas dimensões, e durante mais de hora te ouvimos e te vimos ser, pura e simplesmente, aquela figura.

Lembro uma outra experiência, inesquecível, aquele maldito Mister Peachum que viveste na “Opera dos três vinténs”, na encenação que Luís Paulo Vasconcelos fez para e no teatrinho do Departamento de Arte Dramática da UFRGS. Ali, Maga, mostraste toda a contradição da personagem num jogo dramático inesquecível. Era a roupa que te transformava? Era a luz que te transportava? Não sei dizer, mas sem dúvida, se fechar os olhos, ainda ouço e vejo as tuas palavras.

É curioso, Maga: foste fiel aos diretores. Relembrando a relação de espetáculos de que participaste, dou-me conta de que trabalhaste muito com cada um: Olavo Saldanha, Luis Paulo, Luis Arthur Nunes, Miguel Grant, Vitor Hugo Recondo, Dilmar Messias, Arines Ibias - hoje Presidente do nosso Sindicato de Atores e Técnicos em Artes Cênicas, seu primeiro diretor, aliás - mas jamais te negaste a correr o risco - sim, porque para um ator já reconhecido e consagrado é sempre um risco - de aceitar o convite de um diretor novo. Foi assim com Miguel Grant, foi assim com Luis Arthur, foi assim com Paulo Albuquerque, uma de nossa grandes revelações de direção, foi assim, enfim, com Dilmar Messias.

Queria relembrar, contudo, de todos, o papel que mais me cativou: a tua interpretação do menino excepcional na fantástica obra da dramaturga argentina Roma Mahieu, na peça “Jogos na hora da sesta”. Sem gauchada, Maga, sem vaidades, não creio que o texto de Mahieu, mesmo na Argentina, tenha encontrado uma dedicação e uma introjeção tão fantásticas como a tua. É vergonhoso dizer que chorei durante a representação, que o sofrimento da personagem é como se passasse pela tua pele e nos atingisse em cheio, no cerne, no mais fundo de cada um de nós? Não, não é vergonha, ao contrário, acho que essa confissão que aqui faço, de público, e fora eu um espectador mais ilustre, é a consagração maior e o reconhecimento máximo do ator: ali sobretudo, meu querido Luiz Carlos Magalhães, não eras mais apenas o ator e intérprete, eras a própria personagem ferida e escarnecida nesta terrível metáfora sobre a violência humana em que se constitui a peça de Mahieu.

Tenho te acompanhado, Maga, ao longo dos vinte anos de jornalismo cultural, primeiro no Correio do Povo e hoje no Diário do Sul, que desenvolvi. Te vi fazendo rir e gargalhar em comédias como “O pato torto” de Coelho Neto ou “Rodolfo Valentino” de Gastão Tojeiro.

Emocionar profundamente como em “O Milagre de Anna Sullivan”, ou “Os físicos”, de Dürrematt. Mas te vi, sempre, Luiz Carlos Magalhães, subindo a cada vez, a cena como se ela fosse o lugar ritualístico de sacrifício e ali te imolavas, com bom grado, com inteira doação, com ampla consciência, com absoluto amor, a cada espectador que acorresse ao teatro para te ver.

Poderia falar ainda nos teus recitais, atividade que só atores consagrados podem dar-se ao luxo e à coragem de realizar. Hoje, és intérprete, ao lado de pouquíssimo nomes de nossa cena, como Paulo Autran, Lima Duarte, o gaúcho Walmor Chagas, de grandes poemas como Mário Quintana, Fernando Pessoa ou Luís de Camões, ou mundiais, como Frederico Garcia Lorca e Bertolt Brecht, e para variar de alguns poetas novos.

O que me fascina em teu trabalho, Maga - o que me sugeriu que se apresentasse a esta Casa Projeto de Resolução que te entregasse tal pequena, mas profundamente justa e merecida homenagem - no nome do povo de Porto Alegre que represento parcialmente, mas que a Casa representa no seu todo - e no meu próprio nome, foi querer te dizer que nos deste muitas horas bonitas, apaixonantes, emocionadas, do teu talento, da tua dedicação, do teu carinho pelo teatro.

Luiz Carlos Magalhães, para quem não sabe, humilde e respeitoso funcionário público estadual, ganhando pouco e enfrentando o cotidiano que todos nós enfrentamos durante a luz do dia, transfigura-se e cresce aos olhos de todos nós quando a noite chega: ele se torna o ator, ele se torna o intérprete, ele passe a encarnar aquelas personagens que todos nós, mais ou menos secretamente, um dia, tememos ou aspiramos. E é esta magia, Maga, que o mágico ator concretiza. E por isso merece nossa homenagem: aqui, fora dos refletores, sem qualquer maquiagem, sem figurino especial, à luz do dia, resiste, o ator, o mágico Luiz Carlos Magalhães.

Obrigado, por teres aceito esta homenagem da Câmara de Vereadores de Porto Alegre. (Palmas.)

 

(Não revisto pelo orador.)

 

A SRA. PRESIDENTE: Concedemos a palavra ao Ver. Lauro Hagemann, que falará pela Bancada do PCB.

 

O SR. LAURO HAGEMANN: Sra. Ver. Gladis Mantelli, no exercício da Presidência desta Casa e ora presidindo esta Sessão Solene; Sra. Carmem Sílvia Fonseca, irmã do homenageado; Arq. Paulo Pereira e Silva, representando neste ato o Sr. Vice-Prefeito no exercício da Prefeitura Sr. Glênio Peres; Sr. Arines Ibias, Presidente do Sindicato dos Artistas e Técnicos de Artes Cênicas do Rio Grande do Sul; Sr. Ronald Radde, Presidente da Associação de Produtores de Espetáculos Teatrais do Estado do Rio Grande do Sul; meus prezados Professores Dante de Laytano e Joaquim Felizardo, o primeiro, Presidente da Academia Sul-riograndense de Letras, e o segundo, Diretor do Centro Municipal de Cultura; Prof. Ana Cândida Vilas Boas Gonçalves, primeira professora do homenageado; meu caro companheiro Luiz Carlos Magalhães; Srs. Vereadores; amigos de Luiz Carlos.

Esta Casa se engalana, hoje, ao receber a figura insigne do Luiz Carlos Magalhães, velho companheiro da Rádio Farroupilha, rio-grandino como tantos outros que vieram abrilhantar a radiofonia rio-grandense e que teve que, em determinadas circunstâncias, escolher um outro caminho, um certo desvio, para poder sobreviver.

Infelizmente, o teatro, há 20 anos, não era o que é hoje, era muito difícil sobreviver no teatro. E ainda o é, mas as dificuldades estão diminuindo e graças ao trabalho de tantos artistas que hoje aqui estão reunidos e, especialmente, graças ao trabalho do nosso homenageado.

A figura humana, profissional, do Luiz Carlos Magalhães, é um fato que precisa ser destacado e me sinto muito à vontade para falar nesta figura porque sempre tivemos um convívio fraterno, amável, respeitoso e, sobretudo, simpático.

Eu não poderia deixar passar desapercebida nesta homenagem a presença da primeira professora do Luiz Carlos Magalhães. Eu gostaria, também, de em qualquer circunstância da minha vida, poder homenagear a minha primeira professora porque dali - e creio que o Luiz Carlos vai concordar - nasceram ou nasceu a nossa inclinação por esta difícil arte de bem falar, é isto que o Luiz Carlos através da sua vida profissional; principalmente bem falar a língua que nos serve de instrumento, hoje tão pisoteada, tão maltratada, tão relegada a um plano secundário que se torna quase que um imperativo de segurança nacional preservá-la para garantir a unidade nacional.

Isto o Luiz Carlos Magalhães tem sabido cultivar ao longo da sua atividade e eu sei bem o que isto pode representar porque, também, ao meu modo tenho feito o possível para interpretar corretamente a nossa língua mãe. Não vou falar nos espetáculos que o Luiz Carlos Magalhães nos proporcionou. Apenas, quero dizer como testemunho que também eu certa vez cometi um pecado do qual eu me eximo: de ter pisado, também, em um palco e representado, ninguém se lembra disso, felizmente. Mas, o Luiz Carlos com uma longa trajetória pelos palcos, por recitais é merecedor da homenagem que a Câmara Municipal lhe presta hoje.

A iniciativa do Ver. Antônio Hohlfeldt de conceder o prêmio Teatro Qorpo Santo que esta Casa instituiu, significa o reconhecimento por este estrangeiro que veio habitar esta cidade e que veio trazer a sua contribuição para o nosso desenvolvimento artístico, cultural e social.

Esta Casa não faz mais do que justiça ao conceder ao companheiro Luiz Carlos Magalhães esta título. E nós temos certeza de que ele continuará sabendo honrá-lo como até agora tem sabido.

Meus parabéns e muito obrigado. (Palmas.)

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE (Brochado da Rocha): Com a palavra, o Ver. Raul Casa. S. Ex.ª falará em nome da Bancada do PFL com assento na Casa.

 

O SR. RAUL CASA: Exmº. Sr. Presidente da Casa, Ver. Brochado da rocha; Sra. Carmem Sílvia Fonseca, irmã do homenageado; Arq. Paulo Pereira da Silva, representando o Prefeito em exercício, Sr. Glênio Peres; Sr. Arines Ibias, Presidente do Sindicato dos Artistas e Técnicos de Artes Cênicas do Rio Grande do Sul; Sr. Ronald Radde, Presidente da Associação de Produtores de Espetáculos Teatrais do Estado do Rio Grande do Sul; Prof. Joaquim José Felizardo, Diretor do Centro Municipal de Cultura; Prof. Dante de Laytano, Presidente da Academia Sul-rio-grandense de Letras; Profª. Ana Cândida Vilas Boas Gonçalves, 1ª. Professora do homenageado; Ver.ª Gladis Mantelli, 1ª. Secretária da Câmara Municipal de Porto Alegre, querido homenageado, Luiz Carlos Magalhães.

Bem dizia o feliz proponente desta homenagem, o ilustre companheiro Antonio Hohlfeldt, que ele fez um opção entre falar de improviso e escrever aquilo deveria dizer ao nosso Magalhães.

Dizia o Antonio que queria se ordenar para não cometer erros de improvisos. Magalhães, Antonio, meus amigos, corro risco. Deixarei, Magalhães, que o meu pensamento corra livre e desobrigado, como livre e desobrigado deve ser o pensamento, como livre e desabrigado são os que galopam pelas estepes e savanas do nosso Rio Grande para te dizer que esta homenagem me toca profundamente, quando vejo aqui presente o Poli, o Celso e quem tenho certeza estaria na primeira linha para compartilhar contigo da homenagem que o povo de Porto Alegre te presta, resgatando uma dívida que nós te devíamos.

Quando vi que tu serias o homenageado vieram-me à tona tantas recordações boas, tantas recordações, até dramáticas, de situações que vivemos juntos. Conheço a tua vida, sei do amor que dedicas aos próximos. Tu és uma dessas figuras, Magalhães, que o mundo precisa pelo exemplo, pela dignidade, pela postura, pelo afeto que dedicas às pessoas. Não poderia deixar de registrar nos Anais desta Casa, para a posteridade, quando se compulsar, aquilo que se fez no dia 10/12/1987, para que ali esteja consagrada também a minha homenagem, de irmão teu, para dizer que certamente quando se fizer inventário do mundo, Magalhães, serão os poetas, os atores, os escritores, os artistas, enfim, que serão lembrados e destacados em primeiro lugar.

Tu sabes por que não vou me alongar. Quero deixar consignada a minha emoção, em sendo Vereador desta Cidade, participar desta homenagem que toca tão profundamente a nossa Cidade, em saber que um ator da categoria e expressão faz desta Cidade e desta terra a sua base, rejeitando, certamente, e como sabemos, convites para se transferir a outros centros.

Talvez, por uma dessas coincidências tu até tenhas sido um dos escolhidos para fazer aquela promoção de enaltecimento ao Rio Grande. Magalhães, a homenagem que esta Casa te presta, por iniciativa, que a todos nós causa inveja, do Ver. Antonio Hohlfeldt, é uma homenagem não apenas justa, mas é um incentivo a todos aqueles que, antes desse professor, tão fascinante pela representação, procuram dar aos homens e ao mundo um sentido, uma lição, como é a tua vida. Obrigado Magalhães.

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: A Mesa concede a palavra à Sra. Vereadora Gladis Mantelli, S. Ex.ª falará em nome da Bancada do PMDB com assento nesta Casa.

 

A SRA. GLADIS MANTELLI: Sr. Presidente, Srs. Vereadores, demais presentes. O teatro, inúmeras vezes, parece uma expressão em crise. Em certas épocas quase perde o sentido. Em outras é perseguido. Às vezes refugia-se em pequenas salas escuras, às vezes sai para as ruas e redescobre a luz do sol.

Sua função social tem sido constantemente redefinida. Desde muitos séculos antes da nossa era, até hoje, nunca deixou de existir: há algum impulso no homem, desde seus primórdios, que necessita deste instrumento de lazer e conhecimento, prazer e denúncia.

Do primitivo instinto de ser outro, da necessidade do disfarce e do jogo lúdico, da vontade de o homem de ver a si mesmo reproduzido, do ritual religioso ou profano, da magia e da mais primária imitação da natureza, os espetáculos teatrais têm constantemente ganho expressão própria.

A arte sempre foi uma forma aberta de desafio e rebeldia e o teatro tem assumido, em diferentes períodos de sua trajetória histórica, um papel de agente de contestação.

Subvencionando ou censurado, aceito como serviço público ou perseguido, exaltado ou vilipendiado, questionado ou fazendo da passividade sua razão de ser, protegido pelo Estado ou erguendo-se contra ele, o teatro tem conseguido, milagrosamente, sobreviver.

É nosso dever, como instituição, ressaltar e valorizar as expressões culturais que venham ao encontro dos objetivos de uma sociedade na constante busca de seu aperfeiçoamento.

Ao instituir-se nesta Casa o prêmio de teatro Qorpo Santo, homenagem maior ao dramaturgo gaúcho Joaquim de Campos Leão, queremos premiar o trabalho daquelas personalidades, como o ator Luiz Carlos Magalhães, que por sua contribuição ao teatro, enriqueceu as atividades culturais.

Desde o início de sua carreira, em 1952, até os dias de hoje, Magalhães tem dado um grande exemplo de persistência, de perseverança e amor à arte. Tua trajetória nos mostra uma pessoa que encara o teatro como um trabalho sério, profissional, e dentro desta perspectiva, te entregaste de corpo e alma à arte de representar. Persegues obstinadamente a perfeição, procurando interpretar fielmente os personagens. Um exemplo disto foi teu desempenho em “Jogos na hora da sesta” quando fizeste o papel de um excepcional - trabalho magnifico que provocou aplausos do público e da crítica.

Apesar de gostar muito de receitar poemas, pois segundo tu mesmo dizes “O texto é a mola mestra de qualquer trabalho seu”, Magalhães já fizeste todos os tipos de teatro e ainda cinema e acreditas que muito tens a fazer, pois para ti o teatro é “um aprendizado de vida”. Com toda a experiência adquirida nestes 30 anos de carreira, tens a humildade da dizer que continuas aprendendo.

Recebeste, como merecido reconhecimento pelo teu trabalho, vários prêmios: Ex-cada, por sua atuação em Dom Cristóvão e a Senhorita; Simões Lopes Neto, Prêmio Consulado de Portugal, Prêmio por Teleteatro. Trabalhastes em inúmeras peças (no mínimo uma por ano, durante trinta anos) interpretando diversos personagens, entre as quais, Diário de um louco, A ópera dos Três Vinténs, O Pato Torto, Os Físicos, Reunião de Família.

Sobre Luiz Carlos Magalhães, a pessoa, fomos buscar junto a quem ele convive estreitamente, os traços mais marcantes de sua personalidade. Segundo Arines Ibias, que o dirigiu muitas vezes, o “Maga” como o chamam carinhosamente os colegas de trabalho, é uma pessoa afável e sempre bem humorada, que jamais se atrita com alguém.

Identifica-se com os artistas jovens, procurando prestigiá-los e incentivá-los sempre, para que não desanimem. É extremamente pontual nos seus compromissos. Está sempre na vanguarda dos movimentos teatrais e é entre os nossos atores o que mais se identifica com a arte do recital poético. É o que melhor diz Quintana, Fernando pessoa, Manuel Bandeira, Garcia Lorca, Brecht e o eterno Carlos Drumond de Andrade.

É motivo de satisfação para mim, em nome da Bancada do PMDB, prestar-lhe esta homenagem. Desejamos que continue sempre a nos brindar com sua arte e seu talento. Magalhães, como astro maior do nosso teatro, que a tua persistência e espírito de luta sejam exemplo e motivação para todos aqueles que se lançam na carreira difícil e muitas vezes incompreendida da arte de representar. Muito obrigada.

 

(Não revisto pela oradora.)

 

O SR. PRESIDENTE: Convido o autor da proposição, Ver. Antonio Hohlfeldt, a fazer a entrega da presente homenagem, constituindo em um Diploma, a S. S.ª, Luiz Carlos Magalhães.

 

(O Sr. Antonio Hohlfeldt faz a entrega.) (Palmas.)

 

Com a palavra, o nosso homenageado.

 

O SR. LUIZ CARLOS MAGALHÃES: Imaginem o sério compromisso em que estão me metendo. Num momento como este de rara emoção e, após, as presenças da Antonio Hohlfeldt, Lauro Hagemann, Gladis Mantelli, o meu amigo Raul Casa, que podemos nós, que não temos o dom da palavra na oratória, senão nos sentirmos impotentes para dirigir esta palavra às pessoas aqui presentes. Mas vamos tentar.

Na vida, em todos os sentidos temos que tentar sempre. A minha primeira saudação vai ao Presidente desta Casa, Ver. Brochado da Rocha. Vai uma saudação especial ao Antonio Hohlfeldt, Vereador e meu amigo, proponente desse prêmio que nos foi outorgado e aos seus pares que, com toda a sua bondade, referendaram a proposição. Eu chego a pensar - ah! antes que me esqueça, pois sou desordenado mesmo - minha saudação a todos os componentes da Mesa, meu amigo Dante de Laytano; Felizardo. Mas é que não vou citar todos os nomes, porque senão vou me perder mesmo e até a emoção vai extrapolar. Mas uma referência toda especial a minha querida Ana Cândida Villas Boas Gonçalves. Foi uma grande honra, um prazer imenso vê-la aqui.

Não sendo um orador, eu fico pensando se eu tivesse tentado decorar um improviso, até isso ruiria por terra, porque não é o nosso forte. Mas, parodiando o Drumond de Andrade, 30 anos é um longo tempo, modela qualquer imagem. Se uma figura vai murchando, a outra sorrindo, se propõe. E é necessário que se proponha na vida como na arte, no teatro que é a arte de representar a vida.

Nós que passamos boa parte destes 30 anos representando, quem é capaz de dedicar parte da sua vida à humanidade e à paixão existentes em alguns metros de tablado, este é um homem de teatro. Foi o que nós fizemos e continuamos sendo homem de teatro. E temos a satisfação de dizer isso, neste tempo de teatro, que nós logramos encontrar maravilhosos seres humanos com quem convivemos muitas vezes e com quem, com a graça de Deus, esperamos conviver ainda mais, porque eu pretendo morrer aos 91 anos. E neste seres humanos estão incluídos os atores, as atrizes, diretores e até autores. Dos autores, sem a presença física, eu me lembro com muita saudade Fernando Zimpeck, José Gonçalves, Vitor Hugo Recon e o Carlinhos Carvalho.

E penso, o que eu penso? A palavra não é nosso forte, realmente, mas desejamos agradecer de coração a esta homenagem a quem está aqui presente, atores, atrizes, amigos e amigas, todos os meus irmãos do mundo. E, dentro do tempo que nos cabe, nós vamos fazer um agradecimento a nossa maneira, talvez rompendo, até, o protocolo, nós vamos dizer o nosso agradecimento em forma de verso e em forma de verso nada melhor que lembrarmos o Menino Jesus – e está tão na época - mas como viu Fernando Pessoa, aliás, Álvaro de Campos, no seu “Canto VIII” de “O Guardador de Rebanhos”.

“Num meio-dia, em fim de primavera,

Eu tive um sonho, como uma fotografia.

Eu vi Jesus Cristo descer à Terra,

Veio, pela encosta de um monte,

Tornado outra vez menino,

A correr e a rolar-se pela erva

E a arrancar flores, para as deitar fora,

E a rir, de modo a ouvir-se de longe.

Tinha fugido do céu,

Era nosso demais, para fingir-se de segunda pessoa da Trindade.

No céu, tudo era falso,

Tudo em desacordo com flores, e ervas, a árvores,

No céu, tinha de estar sempre sério e,

De vez quando, de se tornar outra vez homem,

E subir para a cruz,

E estar sempre a morrer, com uma coroa, toda à roda, de espinhos,

Com os pés espetados por um prego com cabeça,

E até com um trapo em volta da cintura,

Como os pretos, nas ilustrações.

Um dia, quando Deus estava dormindo,

E o Espírito Santo andava a voar,

Ele foi à Casa dos Segredos, e roubou três.

Com o primeiro, fez que ninguém soubesse que ele tinha fugido

Com o segundo, criou-se eternamente humano e menino;

E, com o terceiro, criou um Cristo eternamente na cruz,

E deixou-o pregado na cruz que há no céu

E que serve de modelo a Deus.

Depois, fugiu para o sol

E desceu pelo primeiro raio que apanhou.

Hoje, vive na minha aldeia, comigo.

É uma criança bonita, de riso natural;

Limpa o nariz no braço direito,

Se atira nas poças d’água,

Rouba as frutas dos pomares,

Atira pedras aos burros,

E foge a chorar e a gritar com os cães.

E, porque sabe que elas não gostam, corre atrás das raparigas,

Que andam em ranchos, pelas estradas,

Com as bilhas nas cabeças,

E levantam-lhes as saias.

A mim ensinou-me tudo...

Ensinou-me a olhar para as coisas,

Aponta-me todas as coisas que há nas flores,

Mostra-me como as pedras são engraçadas,

Quando a gente as têm na mão

E olha, devagar, para elas

Diz-me que Deus não entende nada das coisas que criou,

Se é que Ele as criou, do que duvido.

Ele diz, por exemplo, que os seres cantam a sua glória

Os seres não cantam nada

Se cantassem, seriam cantores.

Os seres existem, e mais nada

E, por isto, se chamam seres.

E, depois, cansado de dizer mal de Deus,

O menino Jesus adormece

E eu levo no colo para dentro de casa.

Ele mora comigo, na minha casa, a meio do outeiro

Ele é a eterna criança, o Deus que faltava,

Ele é o Humano, que é verdadeiro,

Ele é o Divino, que sorri e que brinca

E, por isto, é que eu sei que ele é o Menino Jesus verdadeiro.

E a criança tão humana, que é divina

É esta minha cotidiana vida do Poeta

E é porque anda sempre comigo

Que eu sou poeta sempre

E que a mínima coisa me enche de sensação

E que o menor som, seja do que for

Parece falar comigo.

A criança nova, que habita onde vivo

Dá-me uma mão a mim e outra a tudo o que existe

E assim vamos os três

Saltando e cantando e rindo

E gozando o nosso segredo comum

Que é o de saber, por toda a parte

Que não há mistério no mundo

E que tudo vale a pena.

A criança eterna acompanha-me sempre

A direção do meu olhar é o seu dedo apontando,

O meu ouvido, atento alegremente a todos os sons

São as cócegas que ele me faz, brincando, nas orelhas.

Damo-nos tão bem um com outro na companhia de tudo

Que nunca pensamos um no outro.

Mas vivemos juntos os dois

Como um acordo íntimo com a mão direita e a esquerda.

Ao anoitecer, jogamos as cinco pedrinhas nos degraus da porta de casa,

Graves, como convém a um Deus e a um Poeta

E, como se cada pedra fosse todo um universo

E fosse, por isto, um grande perigo para ela deixá-la cair no chão.

Depois, eu lhe conto histórias de coisas só dos homens.

E ele acha graça.

Ri de tudo.

Ri dos reis e dos que não são reis.

E tem muita pena de ouvir falar nas guerras

E nos comércios,

E nos navios

Que deixam o fumo no ar dos altos mares.

Porque ele sabe que a tudo isto falta

Aquela beleza que uma flor tem ao florescer

E anda, com a luz do sol,

A varar os montes e os lares

E a fazer doer nos olhos os muros caiados.

Depois, o Menino Jesus adormece

E eu o levo ao colo, para dentro da minha casa.

Deito-o na minha cama,

Despindo-o, lentamente, e como que obedecendo um ritual muito lindo e todo materno até ele estar nu; ele dorme dentro da minha alma, e às vezes acorda de noite e brinca com os meus sonhos, tira uns do lugar, põe uns em cima dos outros e bate as palmas sozinho, sorrindo para o meu sonho. Quando eu morrer, filhinho, seja eu a criança, o mais pequeno, pega-me, tu, ao colo e leva-me para dentro da tua casa, despe o meu ser cansado e humano e deita-me na tua cama e conta-me histórias, caso eu acorde, para eu tornar a adormecer, e dá-me sonhos teus para eu brincar, até que nasça qualquer dia, que tu sabes qual é”.

Esta é a história do meu menino Jesus, e por que razão que se perceba, não há de ser ela mais verdadeira do que tudo quanto os filósofos pensam, e tudo quanto as religiões ensinam? (Palmas.)

E se um dia alguém me perguntasse se valeu a pena? “Tudo vale a pena, se a alma não é pequena.” (Palmas.)

Muito obrigado.

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Para dar aos trabalhos desta Sessão Solene queria, em primeiro lugar, agradecer à Ver.ª Gladis Mantelli que, por absoluta impossibilidade desta Presidência, teve a gentileza de conduzir os trabalhos, lamentando, no entanto, a possibilidade absoluta de estar aqui presente, coisa que, do fundo da alma desejaria, mas que, uma vez mais, comprova que a vida pública traz impossibilidade, e de outra forma, quero dizer que o homenageado de hoje já tinha, além dos serviços prestados à Cidade, como os Srs. Vereadores vincularam, tinha dado a esta Casa uma contribuição, sem dúvida, muito valiosa, quando realizávamos a comemoração da Semana de Porto Alegre, nós entendíamos que deveríamos trazer para a Casa do Povo de Porto Alegre um pouco da expressão artística desta Cidade.

Naquela ocasião, a Diretora da Casa, Professora Rosa Maria Malheiros teve a feliz idéia de ensejar aquele encontro num momento difícil para a Casa que nós tínhamos nas galerias gente, pessoas pleiteando direitos numa pressão legítima fez com que a Casa conseguisse homenagear a Cidade de Porto Alegre e registrar o seu ato, quero crer que foi decisivo para isto o nosso homenageado. A Casa já devia esta gratidão imensa como Casa ao nosso homenageado. Éramos amargos antes de iniciarmos a Sessão até quando Luiz Carlos Magalhães falou. Por isso a casa também deve muito ao Sr. Ver. Antonio Hohlfeldt que traduziu não só a gratidão da Cidade de Porto Alegre, mas também a gratidão da Casa que de certa forma apropria a alma e o talento artístico de Luiz Carlos Magalhães como uma coisa essencial para a Casa. De certa forma, o Ver. Antonio Hohlfeldt teve este gesto que, sem dúvida, torna esta Casa pelo menos grata e respeitosa com aquelas figuras que norteiam a própria Casa que em certos são importantes para ela. S. Ex.ª não só recebeu unanimidade da Casa mas, sobretudo, recebe, de Presidência da Casa, o agradecimento pela proposição que fez um reparo de justiça e, sobretudo, coloca mais na intimidade de todos nós essa alma magnífica e esse talento da Cidade de Porto Alegre. Aliás, a Cidade de Porto Alegre às vezes anda tão afastada das artes, e a própria Câmara, motivo pelo qual nós estamos em conversação - posso já veicular hoje - pois pretendemos um trabalho conjunto para restabelecermos o Salão de Artes Plásticas da Câmara Municipal, que era uma Lei que não vinha cumprida e que o Sr. Ver. Antonio Hohlfeldt trouxe a esta Presidência e que será, daqui por diante, rigorosamente cumprida. Acredito que uma Câmara que representa a sua Cidade, Ver. Antonio Hohlfeldt, não pode ficar afastada da cultura da sua gente. (Palmas.) É o mínimo que se pode exigir de uma Casa que representa uma cidade. Por tudo isso, este ato representa um encontro que nós fazemos junto àqueles que certamente têm para com o professor e artista Luiz Carlos Magalhães e com as artes, um carinho especial. Acredito que a homenagem transcende o fato, até a pessoa do homenageado, se é que é possível transcendê-la, para dizer que nós, passo a passo, retomaremos o convívio e a troca de relações de intercâmbio na área cultural, que era uma das lacunas profundas desta Casa. A cada homenagem que se presta a um artista e a cada convívio que se tem com ele, não faz com que nossa alma seja maior ou menos, mas faz com que ela exista efetivamente. O tamanho dela, Professor Luiz Carlos Magalhães, é o de cada um, mas ela existe dentro de nós.

Por isso, é sumamente grato, sumamente honroso podermos estar aqui, junto com todos os senhores e com todas as senhoras e homenagearmos, sobretudo, abraçarmos figura tão ilustre a quem tem, a Cidade de Porto Alegre, um dívida intangível para com ele.

Muito obrigado a todos os senhores e, sobretudo, o nosso profundo carinho a Luiz Carlos e o meu abraço.

Encerramos esta Sessão Solene, convidamos os Srs. Vereadores para a Sessão Solene, às 19h, para entrega do Título Honorífico de Honra ao Mérito Atlético ao tenista gaúcho Thomaz Koch.

 

(Levanta-se a Sessão às 18h28min.)

 

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